Advogado; Especialista em direito do consumidor, graduado em direito civil e penal e Diretor do Procon de Jaguariúna – SP
O acesso à saúde é um direito fundamental garantido pela Constituição Federal do Brasil de 1988, que estabelece no artigo 196 que “a saúde é direito de todos e dever do Estado”. A prestação de serviços de saúde também ocorre por meio de planos privados, regulamentados pela Lei nº 9.656/1998 e pela ANS. Um problema recorrente é o cancelamento unilateral dos contratos de planos de saúde por parte das operadoras, gerando graves consequências aos beneficiários. Analisaremos os aspectos legais envolvidos no cancelamento unilateral de planos de saúde no Brasil, à luz das normas vigentes e da jurisprudência dos tribunais.
Legislações Aplicáveis e Constituição Federal
A Constituição Federal garante o direito à saúde e a proteção dos direitos dos consumidores nos artigos 5º, inciso XXXII, e 170, inciso V. Isso submete os contratos de plano de saúde às normas de defesa do consumidor.
O CDC (Lei nº 8.078/1990) regula os direitos e deveres no âmbito de saúde e as relações de consumo. O artigo 6º garante direitos básicos aos consumidores, incluindo o acesso à informação clara e adequada, e proteção contra práticas abusivas. O artigo 51 trata das cláusulas abusivas, prevendo a nulidade de disposições que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada. Já a Lei nº 9.656/1998, específica para planos de saúde, regula os planos de saúde, estabelecendo que os contratos devem ser claros quanto às suas condições. O artigo 13 permite o cancelamento unilateral apenas em casos de fraude ou inadimplência do beneficiário.
Resoluções da ANS
A Resolução Normativa nº 195/2009 da ANS reforça essas disposições ao regulamentar que as operadoras não podem cancelar contratos individuais e familiares de forma unilateral, salvo por fraude ou inadimplência.
Cancelamento Unilateral: Condições e Restrições
• Contratos Individuais e Familiares
A Lei nº 9.656/1998 e a Resolução Normativa nº 195/2009 da ANS determinam que a operadora não pode cancelar o contrato unilateralmente, exceto em casos de fraude comprovada ou inadimplência superior a 60 dias nos últimos 12 meses de vigência do plano. O consumidor deve ser notificado até o 50º dia de inadimplência.
• Nos contratos coletivos, a situação é mais complexa. A Resolução nº 309/2012 da ANS permite o cancelamento unilateral pela operadora, desde que haja previsão contratual e notificação com 60 dias de antecedência. Essa diferença tem gerado críticas de órgãos de defesa do consumidor e da mídia. A jurisprudência dos tribunais, em muitos casos, exige justificativas plausíveis para o cancelamento.
Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
O STJ tem entendimento consolidado em proteção aos beneficiários contra cancelamentos abusivos. O tribunal entende que o consumidor não pode ser excluído do plano de forma imotivada ou discriminatória, preservando o direito à saúde e ao tratamento.
Entre as decisões importantes, destacam-se:
• REsp 1.558.086/SP
• AgRg no REsp 1.084.851/SP
Os Tribunais de Justiça estaduais seguem a linha protetiva do STJ. Decisões como a Apelação Cível nº 0036285-43.2013.8.26.0100 do TJ/SP reafirmam que o cancelamento unilateral sem justificativa razoável é proibido e configura afronta aos direitos dos consumidores.
O cancelamento unilateral de planos de saúde no Brasil é um tema sensível que envolve diversas normas legais e interpretações judiciais. Embora a legislação permita o cancelamento em circunstâncias específicas, a prática abusiva tem sido combatida pelos tribunais, em especial quando afeta o direito à continuidade do tratamento de saúde. A jurisprudência orienta que o cancelamento deve ser justificado, notificado e respeitar os princípios constitucionais de proteção à saúde e aos direitos dos consumidores.
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